GARANTIAS NOS CONTRATOS DE CONSUMO
pôr termo ao contrato:
não é remédio imediato, por regra,
mas pode sê-lo por excepção…
O Supremo Tribunal de Justiça [cons.ª Maria da Graça Trigo], por acórdão de
17 de Dezembro de 2015, negou a uma consumidora a hipótese de substituição do
veículo, um Mercedes Benz topo de gama, após sucessivas reparações que, pelos
vistos, a não satisfizeram:
“III - Tendo
a autora optado pelo direito à reparação
do veículo automóvel, não goza mais do direito a invocar tais defeitos ou a
falta de conformidade do bem como fundamento para exigir a substituição do automóvel,
qualquer que seja o momento que se considere.
IV -
Efectuadas sucessivas reparações no veículo e tendo o respectivo custo sido
suportado pela ré representante da marca [e
por quem é que deveriam ser suportados, sim, por quem?], os direitos da
autora encontram-se extintos não por caducidade mas pelo cumprimento.”
Num outro
acórdão do Supremo Tribunal de Justiça [05
de Maio de 2015], o cons.º João Camilo, se entendeu que
“tratando-se de compra e venda de um automóvel novo de gama média / alta que
após várias substituições de embraiagem, de software e de volante do motor,
continuava a apresentar defeitos na embraiagem, pode o consumidor recusar nova proposta
de substituição de embraiagem – a terceira – e requerer a resolução (extinção)
do contrato, sem incorrer em abuso de direito.”, parecendo haver. Contudo, uma
contradição nas soluções aportadas.
Com a Lei Nova das Garantias dos Bens de Consumo, a solução do primeiro caso seria a mesma?
No quadro
actual, em caso de não conformidade do
bem com o contrato, a última coisa de que o consumidor
poderá lançar mão será, em princípio, a de “pôr termo ao contrato” [com a
devolução da coisa e a restituição do preço pago]. A menos que a não conformidade (o vício, a avaria,
o defeito, a anomalia, a diferença entre o declarado e o
oferecido…) ocorra logo nos primeiros 30 dias após a entrega: aí pode a solução
[o pôr-se termo ao contrato] funcionar com sucesso - é o denominado “direito de rejeição” que confere ao
consumidor, em tais circunstâncias, a faculdade de fazer, se o entender, cessar
de imediato o contrato.
Mas o
consumidor pode ainda pôr termo ao
contrato numa mancheia de hipóteses que cumpre enunciar:
§ Se
o fornecedor não efectuar pura e simplesmente a reparação ou a substituição
[e há, em princípio, um limite: 30 dias];
§ Se
a reparação ou substituição se não fizer, como é de lei, a título gratuito ou em
prazo razoável;
§ Se
o fornecedor se recusar a ‘repor a
conformidade’ com justa causa ou
§ Declarar,
ou resultar evidente da sua conduta, que não os reporá em conformidade em prazo
razoável ou sem grave inconveniente;
§ Se
a não
conformidade tiver reaparecido apesar da tentativa de reposição;
§ Se
ocorrer uma nova não conformidade; ou
§ Se gravidade da não conformidade
justificar a imediata extinção do
contrato.
Pode então,
em qualquer destas circunstâncias, o
consumidor pôr termo ao contrato, o
que implicará naturalmente a devolução
da coisa e a restituição do preço pago.
O direito de pôr termo ao contrato não subsistirá,
porém, se o fornecedor provar que a não conformidade é mínima [não podendo, pois, o consumidor aproveitar-se de tal para
o efeito].
Este
cacharolete de medidas dá bem a noção das preocupações da Lei Nova, a fim de
pôr termo às especulações e a dúbias interpretações das instâncias e do Supremo
em detrimento do consumidor.
Mário Frota
Presidente
emérito da apDC – DIREITO DO
CONSUMO - Portugal
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