A CASA MARROM DA JÚLIA DA COSTA – 28.8.22

A CASA MARROM DA JÚLIA DA COSTA – 28.8.22 Ao ledor paciente e curioso que percorrerá este escrito, preciso é um esclarecimento: o título da prosa em curso não pretende indicar a casa de Júlia da Costa, nossa poeta paranaense, que provavelmente não era marrom e nem, ao menos, até agora, eu poderia descrevê-la, visto que Júlia viveu em Paranaguá seus primeiros anos e, empós, casada, em São Francisco do Sul. Não é, entanto, de Júlia minha fala, mas da rua Júlia da Costa, em Curitiba, no Bigorrilho e da sobrevivente Casa Marrom de Janelas Brancas ali existente. Antiga (mas não sei precisar o quanto), de madeira, ocupando terreno de ótimas dimensões, persiste em pé, conservada. Sigo, frequentemente, aos domingos, à feira da praça 29 de março, e faço questão de ir pela Júlia da Costa, a rua, exatamente para passar em frente da Casa Marrom de Janelas Brancas. E toda vez cismo a imaginar como sobreviveu ao inchaço da especulação imobiliária e respectiva demolição da memória. Os proprietários, idosos, saudáveis e longevos, continuam a viver ali? A família, já idos os antigos donos, tem apego ao que representa a casa? Casa, aliás, que não é pequena, nem muito grande, mas tem dimensões que induzem foi (ou é) uma morada confortável e que propiciou, certamente, a vida e a prosperidade de mais de uma geração. Nem bela, nem feia, demarca um tempo, um vislumbre do passado curitibano. Pode ser que seja um imóvel com problemas sucessórios ou de uma pessoa jurídica, uma fundação, talvez vinculada aos que ocuparam a casa e que tiveram uma trajetória social relevante, a ponto, até, de deixar o imóvel para alguma entidade, digamos, benemerente. Estas especulações são presentes a cada vez que, insistentemente, diminuo o passo para apreciar aquela casa simples, de madeira, pé direito alto (ao menos parece), pintada de marrom e as janelas de branco. E eis o elemento que me atrai nela: o temporal. Dá-me um certo conforto saber que ela registra, ainda, outra época, outro momento do bairro e da cidade. Ela conversa comigo, diz Bom dia, quando eu passo, e telepaticamente a cumprimento, respondo, Que bom vê-la novamente, bem pintadinha (coisa de curitibano – falar no diminutivo), bem cuidada, jardim arrumado. Você me faz bem, digo. - Ora, agradeço. Por sorte meus “filhos” tratam com muito carinho de minhas vigas, meu telhado, dos caibros. - Minhas paredes de madeira, tingidas desse marrom, têm certa imponência, mas eu não ligo para isso, fico feliz de saber que sirvo a agradar as pessoas, as conhecidas e as estranhas, como você, nem tão desconhecido assim. Sorrio para a Casa Marrom de Janelas Brancas, invocativa de outro período, afago nas recordações, de certa forma denunciando minha trajetória pela cidade, de quem caminhou por ruas sem pavimento, por outras de paralelepípedo, até chegar o asfalto. Caminhada que viu se irem sumindo as casas, as de madeira e as de tijolo, como dizíamos e serem substituídas por cavernas verticais com, geralmente, gente de tudo quanto é lado. Não, não é crítica alguma à mudança de modelo de moradia, o tal do crescimento demográfico induz a isto. É apenas um lembrar, não melancólico, mas romântico, difuso, cálido, de quem ao longo de seis décadas viu a cidade mudar muito, ora para melhor, por vezes nem tanto. Oxalá persistam algumas Casas Marrom de Janelas Brancas para contarem de onde e de quem viemos, para explicarem que nossa cidade é, o que é, especialmente do esforço daqueles que não viveram em opulência, que tiveram casas e vidas simples, honradas, qualidades capazes, é o que sinto, de preservarem por mais tempo uma vivenda avoenga e seus ecos das relações familiares, as obras de pessoas comuns, honestas, focadas no bem-estar dos seus. Muito Bom dia Casa Marrom de Janelas Brancas, até outro domingo.

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