OS CONSUMIDORES & A ECONOMIA CIRCULAR
PREFÁCIO
Mário Frota
apDC – DIREITO DO CONSUMO - Coimbra
I
PRELIMINARES
A iniciativa que a ADITEC houve por bem assumir – e a que
associou a apDC, que à promoção dos
interesses e à protecção do consumidor se consagra há mais de uma trintena de
anos - constitui algo de relevante no que tange ao delineamento da figura e do
conceito da economia circular e do consumo
sustentável e sua divulgação.
O fino recorte que o seu
vice-presidente, Prof. Doutor Fernando
Silva, empresta ao texto representa uma extraordinária mais-valia que
cumpre, a justo título, enaltecer.
A economia circular – por contraposição à economia linear -, nos
seus plúrimos desenvolvimentos, carece de ser assimilada para que os sãos
critérios que lhe presidem se disseminem e o vulgo, os consumidores em geral,
mas os Estados e os empresários e outros partícipes no processo também,
desencadeiem decisivo esforço em ordem à sua consecução.
O texto de que se tece a brochura, na
sua inteligibilidade, constitui inigualável contributo para a compreensão do
tema nos seus delineamentos factuais e nos seus fundos caboucos doutrinários.
No breve apontamento que no prefácio
se encerra (e se seguirá) abordar-se-á os pontos mais candentes do tema, a
saber,
Ø Do Consumo
Sustentável à Economia Circular
Ø O
Mercado de Consumo e os Produtos Sustentáveis
Ø Iniciativas
tendentes à consecução de um tal escopo
Ø Plano
de acção para a economia circular
Ø Maior longevidade
dos produtos: a emersão de um novo direito de reparação
Ø Epílogo
Força é que se aposte decisivamente
em dois dos pilares em que assenta
uma qualquer política neste particular, a saber, o da formação (a educação) e o da informação,
eternos “impostores” porque não há quem lhes não confira realce em momentos
discursivos, mas não há também quem os eleja verdadeiramente como alicerçantes
de molde a imprimir-lhes decisivo impulso nos momentos apropriados e em termos
de continuidade marcante, que falece sistematicamente.
Porque a formação (e a educação) cria como que uma segunda natureza nos seus
destinatários. E a informação permite
se afira e se ajuste sistematicamente a actuação ao que for sendo dia-a-dia
revelado, numa permanente adaptação à realidade, temperada pelos eventos que se
forem deflagrando na linha do tempo.
A marcante utilidade do opúsculo a
que Fernando Silva confere o cunho
da sua sageza, como pedagogo e homem de acção, aí está no modo como o gizou e
lhe conferiu ponderada concretização.
O proveito que cada um de nós fizer de tão profundos conhecimentos constituirá decerto uma marca para a vida,
um sinal indelével, o alfa e o ómega de qualquer projecto serenamente
arquitectado e criteriosamente alçapremado a obra de valia.
II
DO CONSUMO SUSTENTÁVEL À ECONOMIA CIRCULAR
As
Directrizes das Nações Unidas cujo escopo é o da promoção dos interesses como o da protecção dos direitos do consumidor e remontam originalmente a 9
de Abril de 1985 (Resolução 39/238), ante
as preocupações que ao tempo se registavam, eram omissas no que tange ao consumo
sustentável e a uma adequada gestão dos recursos
em prol da humanidade e do Globo.
No termo de um vasto leque de
diligências encetadas por personalidades de nomeada, a Resolução 70/186, aprovada em
Assembleia Geral de 22 de Dezembro de 2015, consignou o espaço devido ao
consumo sustentável, enunciando princípios e definindo directrizes tendentes a que se
consolide consistentemente esse magno objectivo.
Aí se define consumo sustentável como “a satisfação das necessidades de bens e serviços das
gerações presentes e futuras de tal modo que sejam sustentáveis do ponto de
vista económico, social e ambiental.”
E se estabelece um princípio básico de responsabilidade,
a saber:
“a responsabilidade do consumo
sustentável compartem-na todos os membros e organizações da sociedade”.
E se traça que “os consumidores
informados, os Estados Membros,
as empresas, os sindicatos e as organizações ambientais e de consumidores
desempenham um papel relativamente importante a tal propósito”.
Aos Estados Membros incumbe o delineamento e a aplicação de políticas
de consumo sustentável e a integração de tais políticas nas demais
políticas com conexões relevantes com o ponto.
…
As instituições cuja
prossecução seja a da tutela do ambiente e as de consumidores detêm a suma responsabilidade
na participação e no debate públicos no alargado quadro do consumo sustentável,
carreando a informação adequada aos consumidores e cooperando com os Estados
Membros e as empresas em ordem a apresentar distintas modalidades de consumo
sustentável no elo da cadeia da produção ao consumo.
E como se previne noutro passo,
“os Estados Membros, em conjunção de esforços com as empresas e as pertinentes organizações
da sociedade civil, devem formular e desenvolver estratégias que promovam o
consumo sustentável mediante uma combinação de políticas susceptíveis de
incluir distintos meios, como
§
regulamentos;
§
instrumentos
económicos e sociais;
§
políticas
sectoriais em domínios como o uso da terra, o transporte, a energia e a
habitação;
§
programas
de informação para sensibilização do público em torno das repercussões das
modalidades de consumo;
§
a
eliminação de subvenções que contribuam para fomentar modalidades de consumo e
produção não sustentáveis; e
§
a
promoção de melhores práticas de ordenamento do ambiente específicas para um
tal domínio.”
Aos Estados Membros cumpre, por conseguinte, promover:
§
a concepção,
a elaboração
e a adopção
de produtos e serviços que economizem energia e recursos e sejam inócuos, ante
as repercussões susceptíveis de ocorrer durante todo o seu ciclo de vida.
§
programas
de reciclagem que estimulem ou encorajem
os consumidores a reciclar os desperdícios e a adquirir produtos reciclados.
E controlar de forma segura o uso de substâncias prejudiciais ao ambiente e
estimular o desenvolvimento de sucedâneos ambientalmente comportáveis.
As novas
substâncias potencialmente perigosas submeter-se-ão a avaliações científicas
em momento anterior ao da sua distribuição em ordem a determinar os seus
efeitos, no ambiente, a longo prazo.
Sensibilizar a massa de consumidores acerca dos
benefícios para a saúde das modalidades de consumo e produção sustentáveis, face
tanto os efeitos directos na saúde de
cada pessoa como os de expressão colectiva na tutela do ambiente, eis outro dos
procedimentos que aos Estados Membros cumpre imperiosamente observar.
Em associação com o sector
privado e demais instituições pertinentes, cabe aos Estados Membros estimular a
mutação, a transformação operada das modalidades
de consumo não sustentáveis mediante o desenvolvimento e a adopção de novos
produtos e serviços ambientalmente racionais e de tecnologias de ponta,
inclusive as da informação e das comunicações, susceptíveis de satisfazer as
necessidades dos consumidores e contribuir, por seu turno, para reduzir a
contaminação e o esgotamento dos recursos naturais.
As Nações Unidas exortam ainda, na circunstância, os
Estados Membros a que criem mecanismos reguladores
eficazes de molde a proteger os
consumidores: neles convergirão distintos aspectos do consumo sustentável,
fortalecendo a linha dos subsistentes.
A adopção de instrumentos tanto económicos como fiscais
e a internacionalização dos custos ambientais é algo de indeclinável, no quadro
de preocupações erigido, de molde a promover o consumo sustentável ante as
necessidades sociais, desestimulando práticas não sustentáveis, incentivando práticas
mais sustentáveis e evitando em simultaneidade que prejudiquem o acesso aos
mercados, em particular os dos países em
vias de desenvolvimento.
Em cooperação com as
empresas e outros estratos pertinentes, toca aos Estados Membros a elaboração de indicadores, metodologias e
bases de dados por forma a mensurar os progressos registados em prol do
consumo sustentável, seja em que plano for. Informação que, como parece curial,
terá de estar à disposição do grande público.
Para além de assumirem,
como se tem por curial, a iniciativa de introduzir práticas sustentáveis no seu
próprio funcionamento, em particular em suas políticas de aquisições, importa encorajar,
se for o caso, a elaboração e a adopção de
produtos e serviços ambientalmente racionais
Por fim, há que promover as investigações pertinentes ao
comportamento do consumidor e os
danos ambientais conexos a fim de determinar as vias de consecução de modalidades
de consumo mais sustentáveis.
Este cacharolete de imposições quadra em absoluto a uma nova consciência que perpassa qualquer
política de consumidores no mundo hodierno e se imbrica nos demais planos,
programas e projectos que se estruturem.
III
O MERCADO DE CONSUMO & OS PRODUTOS
SUSTENTÁVEIS
Como se
previne na Nova Agenda do Consumidor
Europeu (Plano Quinquenal de Acção
2021 / 2025 em fase de aprovação), que a lume veio a 13 de Novembro de 2020 sob
a consigna “reforçar a resiliência dos
consumidores para uma recuperação sustentável”, os consumidores europeus revelam um interesse crescente em contribuir
pessoal e directamente para alcançar a
§ neutralidade
climática,
§ preservar
os recursos naturais e a biodiversidade
e
§ reduzir
a poluição da água, do ar e do solo.
O repto consiste em desbloquear tamanho
potencial através de medidas que capacitem, apoiem e permitam a cada um dos consumidores,
independentemente da sua situação financeira, desempenhar um papel activo na transição
ecológica sem impor um estilo de vida específico e sem uma qualquer discriminação social.
O acesso a produtos sustentáveis não deve
depender do nível de rendimento ou do local onde se vive, mas deve estar à
disposição de todos, sem eufemismos nem mistificações.
Ponto é que a
asserção seja assimilada, e o que é mais, concretizada sem reservas ante a
ductilidade das situações geradas.
[Não se
olvide que em 450 milhões de cidadãos da
União Europeia mais de 92 milhões se acham esmagados entre os
limiares da miséria e da pobreza, segundos dados muito recentes… , o
que nos deixa perplexos perante os potenciais de riqueza do Bloco Económico (ainda)
mais poderoso do globo].
“O Pacto Ecológico Europeu estabelece uma
estratégia global susceptível de transformar a UE numa sociedade justa e
próspera, com uma economia com impacto neutro no clima, eficiente em termos de
recursos, limpa e circular, em que o crescimento económico se ache dissociado
da utilização dos recursos e em que os impactos negativos no capital natural e
na biodiversidade se tenham por reduzidos.”
Tal exige uma
mudança profunda, célere, dos nossos hábitos e comportamentos de molde a reduzir a pegada ambiental em todos os
domínios, da habitação e alimentação à mobilidade e lazer.
Projecta-se um
ror de iniciativas de índole
diversa com o objectivo de assegurar
que os produtos, tanto bens como serviços, transmitidos aos consumidores
da EU, sejam adequados a tais
objectivos.
IV
INICIATIVAS TENDENTES À CONSECUÇÃO DE UM TAL
ESCOPO
Cumpre, pela excelente síntese patenteada,
seguir pari passu o que se inscreve, a este propósito também, na recém-lançada e já enunciada Nova Agenda do Consumidor Europeu.
Um ror de iniciativas se aparelham de molde a que
tão magnos objectivos se alcancem.
Cumpre
arrolá-las passo a passo, neste instante:
ü A
Estratégia do Prado ao Prato e a Estratégia da UE para a Biodiversidade,
que proclamam acções-chave e iniciativas
que visam reduzir a pegada ambiental e climática dos sistemas alimentares da UE
e a capacitar os consumidores para escolhas informadas, saudáveis e sustentáveis
em matéria de géneros alimentícios;
ü O
recém-publicado roteiro atinente ao Plano
de Acção para a Poluição Zero, cuja apresentação se diferiu para 2021,
identifica os produtos de consumo como
um domínio de acção importante e explora modalidades tendentes a incentivar
os consumidores a proceder a opções mais ecológicas;
ü A
Estratégia para a Sustentabilidade dos
Produtos Químicos, revelou de análogo modo um sem-número de acções susceptíveis
de incrementar a informação sobre os produtos químicos disponível para os
consumidores, a protegê-los das substâncias mais nocivas e a promover produtos químicos seguros e
sustentáveis desde a sua concepção;
ü Precedendo
o Plano de Acção de 2018, a Estratégia Renovada de Financiamento
Sustentável para os anos subsequentes procurará oferecer
aos consumidores novas oportunidades em vista de um impacto positivo na
sustentabilidade, fornecendo-lhes informações
fiáveis, completas e fidedignas (de confiança) em torno dos produtos
financeiros em que investem; e
ü A
iniciativa Vaga de Renovação
desenvolve uma estratégia em ordem à preparação dos consumidores para uma sociedade mais ecológica e digital, em que se
inclui o reforço dos instrumentos de
informação dispensados ou a dispensar aos consumidores.
V
PLANO DE ACÇÃO PARA A ECONOMIA CIRCULAR
O novo Plano de Acção para a Economia Circular, que
cumpre de análogo modo – et pour cause
– trazer à colação, promove um sem-número de iniciativas
específicas tendentes a
§ combater
a obsolescência precoce e
§ promover
a durabilidade,
§ garantir
a reciclagem e a
§ propiciar
a reparação e a acessibilidade dos produtos,
bem como
§ servir
de alavanca à decisiva acção das empresas,
neste particular.
A Iniciativa para os Produtos Sustentáveis
- cujo escopo é, nomeadamente, o de disseminar pelo mercado a massa de produtos
sustentáveis - estabelece princípios de sustentabilidade, avultando como
propósito a revisão da Directiva
Concepção Ecológica, de molde a difundir, alargando, o seu âmbito de
aplicação, muito para além dos produtos que com a energia se imbriquem, concretizando
a circularidade.
Indispensáveis
se tornam medidas regulamentares e não regulamentares adicionais para grupos
específicos de produtos e serviços, como as TIC (tecnologias ede Informação e Comunicações), a electrónica ou os têxteis, bem como as embalagens.
Por exemplo:
ü A
Iniciativa sobre a Electrónica Circular
visa garantir que os dispositivos electrónicos se concebam com vista à
durabilidade, manutenção, reparação, desmontagem, desmantelamento, reutilização
e reciclagem, e que aos consumidores se outorgue um «direito de reparação», em que se incluem as actualizações de software.
ü A
iniciativa que engloba um carregador
universal para telemóveis e outros dispositivos portáteis visa tornar mais
simples e fácil o dia-a-dia aos consumidores, reduzindo o emprego de materiais
e os resíduos electrónicos associados à produção e à eliminação do produto
específico quotidianamente usado por uma
mole imensa de consumidores.
ü A
Estratégia da UE para os Têxteis (que
no futuro se adoptará) procurará possibilitar aos consumidores a escolha de têxteis sustentáveis, tornando mais
fácil o seu acesso aos serviços de reutilização e reparação.
ü A
revisão da Directiva Embalagens e
Resíduos de Embalagens tem por escopo tornar todas as embalagens reutilizáveis e
recicláveis de forma economicamente viável, reduzindo o excesso de embalagens.
Tais
iniciativas promoverão uma melhor retenção de valor, conferindo prioridade
a produtos mais seguros e duradouros
e garantindo a subsistência dos materiais
no ciclo económico (recusar, reduzir, reparar, reutilizar e reciclar) durante o
maior lapso de tempo possível.
Para forma a permitir
um uso socialmente avantajado dos novos bens e serviços, bem como das novas
abordagens do consumo, os consumidores carecem de uma mais adequada informação e de todo
mais fiável sobre os aspectos da sustentabilidade dos bens e serviços,
evitando-se em simultaneidade uma sobrecarga de informação (informação
em excesso equivale a nula informação, a informação nenhuma…).
Quantos por
bem se houveram submeter à consulta pública promovida a tal propósito,
advertiram enfaticamente para uma clamorosa ausência informação e
para preocupações em torno da fiabilidade
das alegações ambientais e da informação
sobre os produtos, como obstáculos relevantes a uma maior aceitação das escolhas de um consumo sustentável.
A iniciativa
que tende a adoptar-se no futuro acerca da “Capacitação dos Consumidores para a Transição Ecológica” visa
abordar o acesso dos consumidores à
informação (descodificada, simples, acessível…) sobre as características
ambientais dos produtos, incluindo a sua durabilidade, faculdade
de reparação
ou de actualização (com enfoque no software), bem como a fiabilidade
e comparabilidade
de tais informações: o plano definirá os requisitos gerais para preencher regras
mais específicas constantes da legislação sectorial, como, por exemplo, os produtos
ou grupos de produtos específicos.
Uma mais
adequada informação sobre a
disponibilidade de peças
sobressalentes e serviços de
reparação pode ser um factor relevante
mais em prol da durabilidade dos produtos.
A “Capacitação dos Consumidores para a
Transição Ecológica”, que se prende com a política de promoção de produtos sustentáveis
e, se for o caso, as iniciativas sectoriais específicas a
promover, ter-se-ão como essenciais de
molde a conferir aos consumidores um direito efectivo de reparação (ora
na forja, como noutro passo se assinalará).
Além do mais,
a revisão da Directiva Venda de Bens (na calha) proporcionaria uma oportunidade
de analisar o que mais pode ser feito ainda de modo relevante para promover a reparação e incentivar
produtos circulares e mais
sustentáveis. A análise incidirá sobre várias opções dos meios
de defesa do consumidor ante o regime das garantias de bens de consumo
(que decorre ainda de uma directiva de 1999 com modificações decorrentes de uma
outra de 2019, ainda não transposta), tais como
§ a
preferência
pela reparação em detrimento da substituição,
§ o
alargamento do período mínimo de
garantia para os bens novos ou em segunda mão, ou
§ um
novo período de garantia pós-reparação (que já existe em vários ordenamentos dos
Estados-membros da União, aliás, em dados termos).
Tais esforços
poderão ser complementados pela promoção de novos conceitos e comportamentos de consumo, como
§ a
economia da partilha,
§ novos modelos de
negócio que permitam aos consumidores comprar
um serviço em vez de um bem, ou
§ o
apoio às reparações através de acções
das organizações da comunidade e da economia social (por exemplo, as «tertúlias
de reparações») e
§ de
mercados de segunda mão.
Prestar aos
consumidores informações fidedignas e
mais fiáveis significa, muitas vezes, aperfeiçoar os instrumentos
existentes. Os rótulos actualizados, que dispensam informações sobre os produtos e aparelhos abrangidos pela Directiva da Concepção Ecológica e pelo
quadro de etiquetagem energética, concorrerão para aumentar a
sensibilização e gerir as expectativas do desempenho energético dos produtos, contribuindo
destarte para o objectivo que a UE persegue
de eficiência energética.
Além disso, a
adesão
e a sensibilização
para o rótulo ecológico da UE a promover
via acções de comunicação e parcerias com os distintos partícipes, em que se
incluem os comerciantes retalhistas, poderia visar de análogo modo os mercados em linha ante a proliferação,
nos tempos que correm, do comércio
electrónico.
Como acréscimo,
o rótulo ecológico da UE alargar-se-ia aos produtos financeiros de retalho, em conformidade com o Plano de Acção de 2018 sobre o financiamento
sustentável, permitindo aos consumidores confiar num rótulo credível sempre que invistam em produtos
financeiros ecológicos.
Por outro
lado, os consumidores têm de estar mais
bem protegidos contra informações
não verdadeiras ou apresentadas de forma confusa ou enganosa para dar a impressão errada de que um produto ou uma empresa são mais respeitadores do ambiente,
o chamado «branqueamento ecológico». Acções no domínio do financiamento
sustentável cabem do mesmo passo em tais iniciativas e acham-se em vias de se empreender.
Além disso, a
Comissão Europeia intentará propor que as empresas fundamentem as suas alegações ambientais utilizando métodos de
pegada ambiental dos produtos e instituições, a fim de fornecer aos
consumidores informações ambientais
fiáveis.
A Comissão
Europeia propor-se-á analisar ainda formas de criar um quadro de rotulagem
sustentável que abranja, em sinergia com outras iniciativas pertinentes, os
aspectos nutricionais, climáticos, ambientais e sociais
dos produtos alimentares.
As opções dos
consumidores no domínio da energia
serão fundamentais para a concretização de novas metas em matéria de clima para 2030 e a neutralidade climática até 2050.
As novas
regras, em vigor desde 1 de Janeiro do ano em curso, beneficiarão
decerto a informação aos consumidores através da facturação da electricidade e de ferramentas independentes de
comparação de preços, e tornarão mais simples e fáceis as opções dos prossumidores
e a criação de autênticas comunidades
de energia.
A Comissão
Europeia proporá disposições aplicáveis a outros vectores energéticos a fim de conceder direitos semelhantes aos
consumidores de gás e de aquecimento urbano.
A transformação digital também oferecerá novas
oportunidades em ordem ao acervo de informações mais específicas e de mais
fácil compreensão.
O
desenvolvimento de passaportes digitais
para produtos no âmbito da Iniciativa dos Produtos Sustentáveis visa ajudar a informar os consumidores sobre
os aspectos ambientais e circulares dos produtos.
Em termos
genéricos, a informação digital poderá
conferir aos consumidores a faculdade de contrastar a fiabilidade das informações,
efectuando comparações entre produtos, mas de análogo modo carreando ou
veiculando informação de forma mais holística sobre os impactos ambientais, verbi gratia, a sua pegada de carbono.
As acções e os recursos (designadamente do Instrumento
de Assistência Técnica para o
reforço das capacidades no âmbito do próximo QFP) há que utilizá-los de molde a
apoiar iniciativas que promovam e incentivem a cultura e o comportamento de um consumo
limpo, climaticamente neutro e sustentável.
Tal deve ser feito sob formas acessíveis, inovadoras e apelativas, como, por
exemplo, através de aplicações para telemóveis inteligentes e de sítios Web, e pelo
recurso aos instrumentos existentes.
As empresas,
em que se incluem as PME, desempenharão decerto relevante papel na demanda de
um consumo mais ecológico.
A integração
dos objectivos de sustentabilidade nas estratégias e nas tomadas de decisão
empresariais poderá resultar na disponibilidade e outorga de produtos mais
sustentáveis.
Exemplos
de boas práticas vão desde a monitorização de impactos, dependências e riscos ambientais e capital natural em toda a cadeia de valor, à
inclusão de informações ambientais na divulgação de informação aos
consumidores, passando pela consideração dos interesses dos consumidores
nas decisões das administrações das empresas.
A Comissão Europeia
intenta apresentar em 2021 uma iniciativa
legislativa sobre o governo
sustentável das empresas de molde a promover um comportamento empresarial
sustentável e responsável a longo prazo.
Para forma a estimular
uma acção empresarial mais voluntariosa,
é propósito da Comissão Europeia
cooperar com os operadores económicos em ordem
§ a
incentivar os seus compromissos voluntários de divulgação pelos consumidores da pegada ambiental da empresa,
§ melhorar
a sua sustentabilidade e
§ reduzir o impacto no
ambiente.
Tais
compromissos desenvolver-se-ão em sinergia com o futuro Pacto Europeu para o Clima: basear-se-ão em metodologias,
instrumentos e legislação aplicável já disponíveis.
Ao longo do tempo, os compromissos serão
susceptíveis de envolver partícipes de um vasto leque de sectores, com base em modalidades
compromissórias cada vez mais diversas.
VI
MAIOR LONGEVIDADE DOS PRODUTOS
A EMERSÃO DE UM NOVO DIREITO DE REPARAÇÃO
O objectivo que
neste passo se imbrica é o de conferir maior
longevidade aos produtos e menor degradação de recursos disponíveis.
Como noutro
ensejo nos exprimíramos, o European
Environmental Bureau estima que o tempo de vida útil de um smartphone
se situe entre os 25 e os 232 anos.
E, na realidade, não mais de 3 anos dura o equipamento.
“Os custos ambientais e económicos de um
tal hiato
são excessivamente onerosos e
incomportáveis.”
A aprovação
de regras que estendam a longevidade de alguns dos dispositivos em 5 anos,
representaria, no Espaço Económico
Europeu,
§ a diminuição de 12
milhões de toneladas anuais de equivalente-CO2, o que
§ significaria retirar
de circulação 15 milhões de veículos movidos a combustíveis fósseis…
Um novo “direito de reparação” se desenha, no
quadro actual, de molde a dar mais vida
aos produtos.
Para fazer renascer mesteres que, entretanto, se extinguiram porque mais fácil substituir que reparar?
Reparar… por forma a que seja mais
acessível manter o produto que substituir?
Ou será mais oneroso reparar pelo valor da mão-de-obra? Claro que tal dependerá
obviamente da categoria dos produtos e da sua peculiar concepção…
Trata-se, na
realidade, de uma autêntica revolução
a que ora se esboça.
Será que a inversão do paradigma não constituirá
obstáculo à Inovação & Desenvolvimento?
Não haverá
que curar de um equilíbrio ponderado de molde a evitar que o progresso se
estanque, paralise?
Um tal
exercício demandará decerto uma dose apreciável de “engenho & arte” e não se solucionará de uma penada só…
Ou será que a evolução de novos modelos inteiramente
recicláveis (e de acesso universal, ao alcance de qualquer bolsa… ponto é
que o seja deveras!) não configurará o cenário
preferível?
O mote para o debate está dado…
Importante é
que esquadrinhemos todos os ângulos, envolvendo na discussão os partícipes por inteiro [Universidades, Centros Tecnológicos
& de Investigação, indústria, serviços, distribuição (associações de interesse económico), consumidores…] para que soluções mais adequadas se logrem e
imponham no interesse geral.
O Parlamento Europeu, por Resolução de 25 de Novembro pretérito, sob o lema
“Rumo a um Mercado Único mais Sustentável
para Empresas e Consumidores”,
confere
particular relevo ao “Direito à
Reparação dos Produtos” (intentando uma estratégia fulcral em matéria de
REPARAÇÃO de BENS DE CONSUMO).
Emitiu, nesse
sentido, um sem-número de recomendações que visam, com efeito, dar forma a um
MERCADO INTERIOR SUSTENTÁVEL (delimitado
pelas fronteiras exteriores do denominado Espaço Económico Europeu), como
convém e constitui, nos tempos que correm, imperativo indeclinável de uma
qualquer política europeia de consumidores com reflexos no plano global.
E enumera um amplo
leque de medidas que há que trasladar para a lei e se compendiam como
segue:
·
A outorga de um
«direito de reparação» aos consumidores
·
A promoção da reparação em vez da substituição
·
A normalização das peças sobresselentes susceptível de
promover a interoperabilidade e a inovação
·
O acesso gratuito às informações necessárias para
a reparação e a manutenção
·
Um cacharolete de
informações que
aos produtores incumbe em matéria de disponibilidade de peças sobresselentes,
actualizações de «software» e a
faculdade de reparação de um produto, nomeadamente acerca de:
o
período estimado de
disponibilidade a partir da data da compra,
o
preço médio das peças
sobresselentes no momento da compra,
o
prazos aproximados
recomendados de entrega e reparação
o
e informações sobre os
serviços de reparação e manutenção
·
O
período mínimo obrigatório para o fornecimento de peças sobresselentes em
consonância com a duração de vida estimada do produto após a colocação no
mercado da última unidade
·
A garantia de preço
razoável para as peças sobresselentes
·
A garantia legal para
as peças substituídas por um reparador profissional quando os produtos já não
estiverem cobertos pela garantia legal ou comercial
·
A
criação de incentivos, como o «bónus do artesão», susceptíveis de promover as reparações, em particular após
o fim da garantia legal.
“Dar mais vida aos produtos para que a vida
se prolongue”: eis o lema de uma estratégia convertida em nova política de
consumidores!
“Dar mais vida aos bens para que se dê mais vida
à vida”!”
VII
EPÍLOGO
O
corpo de doutrina que neste passo se
encerra constitui um desafio incomensurável que a comunidade (os consumidores
informados, como o quer a Resolução das Nações Unidas de 22 de Dezembro
de 2015: e enorme hiato nos separa já desse momento histórico…) terá
inequivocamente de responder perante a finitude dos recursos e os perigos e
riscos acrescidos que se antevêem para as reservas naturais do globo que
definham instante a instante às mãos dos algozes que todos somos, afinal.
O
paradigma é outro! Tem de ser outro,
na avidez com que a ignorância nos vai brindado por se não haver atingido o
zénite na compreensão do mundo e dos seus recursos e pela atracção permanente e
sugestiva das novidades a que o aporte das
tecnologias iniludivelmente conduz.
Trabalhos
do jaez destes, com o cunho, o timbre que o Prof. Doutor Fernando Silva lhe
soube emprestar, constituem uma alavanca relevantíssima para que cada um e
todos se consciencializem da magna tarefa que se impõe e cumpre empreender para
que as gerações vindouras não sejam desapossadas dos seus sonhos e utopias e o
legado que se lhes transmite não constitua um “enorme presente envenenado” que lhes deflagre nas mãos e arruíne o
seu promissor devir!
Que,
na sua essência, o universo-alvo a
que se dirige (a comunidade, afinal, de consumidores
e cidadãos) o intua, o compreenda, o
estime e assimile e de quanto se exara de tudo faça pendão: é que “petit-à-petit l’oiseau fait son nid” (grão-a-grão
encha a galinha o papo…).
Rejubilemos, enfim…
Que
é pela educação que o futuro se resgata!
Fontes (que se seguem de muito
perto e se replicam):
§ Novo
Plano de Acção para a Economia Circular
§ Nova
Agenda do Consumidor Europeu
§ Resolução
de 25 de Novembro do Parlamento Europeu
Coimbra (em exílio forçado),
Fevereiro de 2021
Mário
Frota
Presidente da apDC
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