Pântanos e rabo de camaleão

 Pântanos e rabo de camaleão


                                                                                                      por tonicato mir

                                                                                                    Curitiba, 07.05.2025.



“Um lugar bem longe daqui” este é o nome do filme assistido ontem. Tinha um pântano belíssimo e a cabana onde o mobiliário eram desenhos feitos pela principal personagem. O final foi surpreendente – como seus desenhos – contrariando a decisão do júri onde foi julgada pela comunidade preconceituosa, em arrependimento.


Falava nesta quarta-feira com um amigo que existem outros pântanos. De manhã assisti na TV um documentário sobre o jazz e as drogas. Muitos dos músicos que tinham a minha admiração nos anos 1960 estavam ali. Eles entregaram-se e morreram no pântano das plantas devoradoras de vida, como a heroína, ainda que as suas almas sensíveis e virtuosas tocassem esplendorosamente nos meus ouvidos.


Mencionei ao amigo: __ A droga estava para o jazz assim como a corrupção está para o político. De início tudo é capim, mas em um momento até o capim vai gerar flores, como ocorre com a flor da “espada-de-São-Jorge”. Políticos novos começam com projetos para mudar o mundo, mas logo afundam na lama da tentação e do pântano, deixando suas pegadas ao retirar com seu voto uma emenda da pauta do dia em troca da obtenção de algum recurso extra.


Esqueçamos. Qual o valor de uma amizade? Eu diria: muito. Por vezes ela está na relação entre casais. Por vezes precisa de mais, de novas águas do pântano; de um ombro fora da relação carnal e marital. Precisa de um tertius. E não somente para tomar cafezinhos, cervejas ou gins-tônicas. Ela precisa de outros insetos, tal qual os voos de libélulas no pântano dos relacionamentos. Precisa se embebedar de elogios ou de palavras-porradas onde sua cegueira esquece de quem lhe bate.


Outra imagem. Uma multidão aguarda na Praça São Pedro. Aguarda o quê? O anúncio de um novo papa para gerir a igreja católica. Neste pântano de pessoas fico a pensar com meus zíperes: qual significado da fumaça mudando de cor? Ela transforma corações presentes quando passa de preta para branca.


E se um papa negro fosse eleito? Será que mudariam as cores da negação e da aprovação? Acho que não, mas seria importante à igreja e ao mundo anunciar um cardeal preto. Não sei. Acho que é melhor deixar os pântanos como são: selvagens; paraíso dos bichos e das pessoas de vida simples. Não à redenção da culpa de anos de desprezos e de abandono.


Quase a finalizar esta crônica revelo o final do filme, como o “Amigo da Onça” da Revista ‘O Cruzeiro’. Acho que quem matou o homem foi... Mentira! Eu não vou revelar nada. Provoquei apenas pessoas habitando os pântanos da curiosidade, mas sintam-se compelidas a ver o filme. Ele nos mostra uma lição formidável.


Existem nos pântanos jacarés e cobras, com insetos de uma beleza que somente o olho atento pode apreciar além das picadas. Eles são translúcidos, coloridos, com formas que servem à criação de filmes de ficção científica. Tais espécies são lindas, mas a moça vivendo na cabana não é bonita. Ela é feia, com pernas cambitas, nariz torto, mas ao mesmo tempo bela, em sua resiliência de vida, uma artista admirável.


Vejam o filme e os pântanos do planeta Terra. Eles os podem encantar. Não precisa ir lá. É melhor não os visitarem. Não façam a Mentira do Bicho. Ou seja, do rabo do pequeno réptil. Não vão aos pântanos e deixem rabos como o camaleão cortado pela boca de um carnívoro maior.

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